Crítica e Criticismo: Servos ou Fregueses?

O sujeito se dirige à igreja para cultuar a Deus. Ele não tem lido muito a Bíblia ultimamente - apesar de já ter lido todo o texto sagrado algumas dezenas de vezes ao longo da caminhada cristã. A expectativa é a de ouvir a voz de Deus. O culto começa e o responsável pela sonoplastia deixa escapar uma microfonia, um ruído ou volume indesejado do sistema de som. Há uma ligeira irritação, mas até aí "tudo bem".

O grupo de louvor desafina e entoa cânticos do arco da velha ou tão novos que é necessário por os olhos no telão para acompanhar a projeção do novo e desconhecido "corinho". A irritação aumenta e no íntimo, o cidadão considera como seria bom se os irmãos cantassem aquela música. Orações são feitas, e na leitura bíblica alternada, o vovô do banco ao lado aperta os olhos, lendo alta e descompassadamente um longo texto bíblico. A pregação começa e o pregador não é tão eloquente quanto o esperado.

O sermão é bíblico e expositivo, mas nosso personagem está ocupado demais divagando, imaginando como o pastor deveria pregar de um outro 'jeito'. A bênção apostólica é impetrada e a parte mais 'interessante' é encontrar com o pessoal na lanchonete da moda. Alguém comenta sobre o sermão e nosso personagem passa a descrever como o culto teria sido perfeito se isso ou aquilo tivesse sido feito. O culto - e a vida cristã como um todo - deixa de ser regulado pela Palavra e passa a ser subjetivo e circunstancial.

Talvez você não tenha se identificado com o hipotético quadro acima. Mas, infelizmente, em maior ou menor grau, essa tem sido uma realidade em nossas igrejas. Pessoas que têm investido cada vez mais em ler sobre teologia - o que é MUITO bom! - mas que se tornaram críticos 'profissionais', ou fregueses. Não precisamos gastar tempo argumentando que é de suma importância que sejamos criteriosos e examinadores à luz da Palavra. Que em face de desvios e heresias, muitos têm sido arrastados por não refletirem e engolirem tudo o que é dito. O Rev. Augustus Nicodemus costuma afirmar, com toda razão, que "Cristo morreu na cruz para tirar o seu pecado e não a sua inteligência", portanto, ouse pensar.

Mas, pare um instante e reflita comigo: O que você tem feito em face a todas as críticas que tem feito para com a igreja, líderes e atividades eclesiásticas? Saiba que você pode e deve exercitar seu pensamento crítico. Grandes avivamentos e reformas (incluindo a Reforma Protestante, do séc. XVI) nasceram de crentes inquietos que rejeitaram o status quo e os desvios de sua época, denunciando corrupção, pecado e motivações erradas. Todavia, o exame realizado levava Deus a sério e tinha como crivo e árbitro as Escrituras Sagradas em detrimento de apetites pessoais. 


Algumas motivações erradas na hora de fazer críticas e seus respectivos 'antídotos':


  1.   Preocupação excessiva com minha reputação: "O que irão pensar de mim se frequentar determinada reunião?" Antídoto: O que Deus pensa a esse respeito? (Atos 4:15-21);

  2.   Preocupação excessiva com gosto pessoal (subjetividade): "Não gosto quando "X" gênero musical é executado na adoração pública. Prefiro gênero "Y"". Antídoto: Se o conteúdo é bíblico, a forma convém, mas particularmente não me agrada, devo me esforçar em reter o que é bom (conteúdo bíblico), pensando também na coletividade. (Filipenses 2:4; 1 Tessalonicenses 5:21);

  3.  Identificação de fraqueza e/ou incompetência alheia: "O pastor e/ou pregador está equivocado no seu raciocínio. Tal conclusão não parece ter amparo nas Escrituras". Antídoto: Todos nós somos propensos a falhas. Sejam elas fruto de pecado, equívoco ou incompetência / incapacidade. Nesses casos, a Bíblia nos encoraja à confrontação sadia, visando a glória de Deus e a correção com "espírito de brandura". (Gálatas 6:1-5; Mateus 18:15-20);

  4.   O conteúdo NÃO é bíblico, não posso ser conivente com tal: "A liturgia da igreja da qual sou membro, as práticas pastorais e posicionamentos contrariam muitas vezes o que preceitua a Bíblia". Antídoto: A igreja é a noiva de Cristo, que no fim dos séculos se apresentará perante Ele perfeita, sem mácula nem ruga, mas hoje ainda vive na presença do pecado. Quando o pecado ocorre é de suma importância aplicar sem restrições os passos para a confrontação e disciplina contidos em Mateus 18:15-20. É preciso entender também que a noiva é de Cristo e não nossa (seja você líder ou não). Pensar nessa perspectiva implica dizer que o zelo pela sã doutrina deve ser frequente, mas nunca dissociado de dependência de Deus. Antes mesmo de qualquer confrontação, deve-se orar por tal situação e/ou pessoas envolvidas. Em casos extremos, onde não há correção, mas rebeldia contumaz, debaixo de muita prudência e oração, deve-se considerar uma mudança drástica (como p.ex.: transferir-se para outra igreja);

  5. Preciso desabafar minha discordância com determinada pensamento e/ou prática ministerial: "Às vezes a pretexto de orar por Fulano, procuro outras pessoas para me queixar deste. Estou angustiado e preciso compartilhar com alguém". Antídoto: Você pode estar chamando de desabafo uma prática infeliz e demoníaca conhecida como fofoca! Se Beltrano não está envolvido na questão, não é ele quem você deve procurar, mas Fulano (que está diretamente relacionado). Nessas horas, seja objetivo: procure resolver e não propagar falhas, dificuldades ou pecados alheios. Se sentir-se perdido em como tratar a questão, procure alguém maduro espiritualmente (pode ser o pastor, presbíteros, diáconos ou membros mais experientes da igreja) visando tão somente o aconselhamento, e não o fuxico. (Provérbios 11:12-13; 16:28; 21:23).

Devemos lembrar que Deus nos criou para o louvor de Sua glória. Ele nos chamou para sermos servos tal qual Ele mesmo foi (Filipenses 2:5-10) e não fregueses. A expectativa do freguês é ser agradado e ter sempre a razão. A perspectiva do verdadeiro cristão é agradar e servir, glorificar e desfrutar a Deus para sempre. Pensar acuradamente é um exercício vital a fé cristã. Todavia, quem pensa, pensa em alguém - esse alguém pode ser eu mesmo, outrem  ou Outrem (Deus). Portanto, tudo deve passar pelo critério máximo da pergunta essencial: Isso (pensamento, ato, omissão e/ou ação) glorifica a Deus? Ou ainda: fazendo isso estarei agradando a Deus e mais próximo a Ele?

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