TEM CUIDADO DE TI MESMO E DA DOUTRINA
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Desenho digital por Krita, baseado na obra O Pensador, de Rodin. |
Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina.
Persevera nestas coisas; porque, fazendo isto, te salvarás, tanto a ti mesmo
como aos que te ouvem. (1 Timóteo 4:16)
Recentemente, em MG, um colega pastor
tirou (segundo informações preliminares da Polícia) a própria vida em um ato de
desespero e sofrimento extremo. É pena constatar que esse não é um caso
isolado, o que faz soar o alerta a todos quantos "pensam estar de pé"
(1 Coríntios 10.12). Não há como não refletir sobre a caminhada e sobre como
lidar com as adversidades e desafios inerentes ao ministério ordenado.
Compartilho alguns apontamentos pessoais.
1. QUEM NOTARÁ QUANDO VOCÊ COMEÇAR A
MUDAR?
É
sabido que ninguém está isento de crises e dificuldades profundas. Os
reformadores chamavam períodos assim de "a noite escura da alma".
Considero de uma felicidade extrema a tradução que a Almeida 21 fez do verso 4,
do Salmo 23: "Quando eu tiver de andar pelo vale da sombra da morte
(...)". Em consonância com João 16.33, a certeza que temos é que nesse
mundo ninguém está imune às intempéries e sofrimentos. É sabido também que
crises e dificuldades não nascem, pelo menos grosso modo, do dia para a noite.
É um processo. E nesse processo, costumamos dar sinais. Alguns sinais são mais
gritantes, escandalosos quase; outros são quase imperceptíveis, mas estão lá. A
pergunta é: quem notará quando você começar a mudar (ou emitir sinais de crise,
cansaço ou sofrimento)? Não é fácil para o pastor achar esse ombro amigo, capaz
de perceber mudanças preocupantes em sua caminhada. Há quem esconda de sua
esposa grandes preocupações e angústias, no afã de protegê-la, como líder e
principal pastor da mesma. Já namorei essa ideia e afirmo: não é um sábio
caminho. O cuidado com a esposa é bíblico e louvável, mas faço algumas
objeções: Até onde vai o limite entre protegê-la e deixar que ela também cumpra
seu papel primordial de auxiliadora para o qual Deus a criou? Talvez seja tempo
de deixarmos nossas esposas serem usadas por Deus como instrumentos em nossas
vidas. É tempo de relembrarmos o significado e o peso do termo
"auxiliadora idônea" (ou seja, correspondente);
2. PASTOREAR NÃO É ESTAR ACESSÍVEL O
TEMPO TODO.
Nesses
pouquíssimos anos de caminhada ministerial, tenho aprendido a dura lição de que
as ovelhas não são minhas, elas pertencem ao Supremo Pastor, Cristo Jesus. Por
essa razão, há inúmeras situações que fogem à minha alçada; há inúmeras
respostas que não posso dar, não por falta de empenho e dedicação nos estudos e
aperfeiçoamentos, mas porque sou também limitado, falho e absolutamente
dependente de Deus. Parece bobagem, mas um grande desafio para a maioria dos
pastores é aprender a desligar o celular nos momentos de devoção particular e
familiar; nas folgas pastorais dar-se o direito ao "dolce far niente" ou tomar as refeições com a família sem ser
importunado pelos bips, cliques, toques polifônicos, campainhas e afins. A
igreja precisa ser ensinada que há tempo para tudo. Como jovem, tenho
naturalmente investido significativo tempo a essa parcela da igreja, embora não
me restrinja a ela. Posso fugir aos manuais ou até mesmo aparentemente me
contradizer aqui, mas faz parte de meu ministério trazer esse pessoal para
minha casa e faço com o maior prazer. Na mesa em que escrevo esse texto,
costumo receber semanalmente de 12 a 20, por vezes, até 30 jovens com seus 20 e
poucos anos. Aqui nessa mesa choramos juntos, estudamos a Bíblia juntos,
jogamos jogos de tabuleiro, comemos cuscuz e tomamos café passado na hora.
Todavia, esses mesmos jovens que "invadem" minha casa, se esparramam
no meu sofá e participam da íntima comunhão de minha mesa, sabem que assim como
eles, também tenho necessidades de solitude e principalmente de tempo gasto com
minha família. É um alívio poder ensiná-los e desfrutar de um relacionamento
sadio que aponta para Cristo e não para uma liderança personalista e dominadora
(cf. 1 Pedro 5.3), pura graça de Deus;
3. PASTOREAR IMPLICA FRUSTRAR
EXPECTATIVAS E ABORRECER IDEIAS
A
sabedoria de Deus é maravilhosa e espantosa (Salmos 139.6)! O caráter atemporal
das Escrituras Sagradas se faz notar em todo o cânon – de Gênesis a
Apocalipse, vemos uma Palavra antiga destinada ao homem de todas as épocas,
gerações e culturas. Provérbios 27.6 penetra num dos meandros mais difíceis a
qualquer mortal debaixo dos céus, a saber, a confrontação amorosa. O texto diz:
“Leais são as feridas feitas pelo amigo, mas os beijos do inimigo são enganosos”.
Quanta energia e quanta angústia em ser desafiado pelo dilema eterno dizer a verdade e desagradar profundamente
ou calar-se, ou muitas vezes, até mesmo
adular para manter uma [falsa e maldita] e paz! Não tenho o menor pudor em
dizer que sofro com isso. Como me é, muitas vezes, custoso, ser desagradável
(ato de desagradar a alguém) e firme em expor o erro e chamar à correção. Oro a
Deus para que a fidelidade a Ele seja sempre minha vara de medir, na certeza de
que Ele é meu porto seguro para onde retorno sempre que me meto a besta querendo navegar em águas que não me competem. Faz parte do ministério aborrecer
ideias, tocar e produzir feridas necessárias para o despertamento ou retorno ao
Evangelho. Quem não deseja sofrer as consequências disso, carece de ser chamado
ao genuíno Evangelho. Humanamente, somos esmagados com uma Palavra que SEMPRE
exaltará a Deus e humilhará o homem, e quando você se torna portador dessa
mensagem – seja você ministro ordenado ou não, automaticamente trará inimizades
e incompreensão. Solidão e perseguição. Porém, que consolo é saber quão felizes
somos quando enfrentamos tais situações (Mateus 5.10-12). Que paradoxo
maravilhoso!
Meu
coração, aprenda. E ensine. E aprenda mais uma vez.
Em
Cristo, Descanso para nossas almas.
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