SÍNTESE DO PENSAMENTO ECONÔMICO E SOCIAL DE CALVINO


Como outros líderes da Reforma, João Calvino* rompeu com a tradição medieval de elevar a “vida contemplativa” acima da “vida ativa” do trabalho diário. O trabalho, diz Calvino, é uma atribuição de Deus pela qual os indivíduos servem ao bem-comum. Deus nos criou não somente como indivíduos, mas como indivíduos em comunidade. Dependemos uns dos outros e devemos servir uns aos outros com os diferentes dons que nos foram dados. Portanto, todas as formas de trabalho são de igual valor e são igualmente agradáveis a Deus se beneficiam de algum modo a comunidade e não contradizem a Palavra de Deus. Não trabalhar quando se tem a capacidade [e a oportunidade] de fazê-lo é algo contrário à Palavra de Deus. Mas, ao mesmo tempo, não proporcionar trabalho para aqueles que são capazes também é errado. Assim sendo, Calvino e a cidade de Genebra iniciaram um programa de obras públicas para os milhares de refugiados que estavam afluindo para aquela cidade.

Calvino também aplicou a perspectiva do evangelho à questão dos salários. Para o empregado, o trabalho deve ser entendido como algo feito em primeiro lugar não pelo dinheiro, mas para a glória de Deus. De fato, as pessoas não têm realmente um direito à remuneração; qualquer salário que recebemos é na realidade uma expressão da graça de Deus para conosco – gratuita, imerecida. Porém, do ponto de vista do empregador, o salário deve ser justo. Afinal, o que está ocorrendo é uma dispensação da graça divina e o empregador é um instrumento desse processo. Na verdade, para um empregador cristão, pagar o salário mínimo legal não é suficiente. Como disse Jesus, devemos sempre fazer aos outros como queremos que nos façam.

Finalmente, Calvino fez uma nova abordagem à usura ou à cobrança de juros. A igreja havia proibido toda usura na Idade Média, muito embora algumas pessoas continuassem a praticá-la. Todavia, Calvino argumentou que a Bíblia não proíbe toda forma de usura. As proibições bíblicas contra a mesma precisam ser lidas em seu contexto. A usura foi proibida entre os israelitas da velha dispensação, diz Calvino, porque lhes era fácil realizar negócios sem ela. Mas aquelas circunstâncias mudaram em nossos dias. E a instrução de Jesus, “emprestai, sem esperar nenhuma paga” (Lucas 6.35), visava orientar o nosso relacionamento com os pobres, não com todas as pessoas. Seja como for, Calvino acreditava que quando se tratava de emprestar dinheiro a juros, o nosso comportamento devia ser governado acima de tudo pela lei bíblica do amor. Somente porque uma coisa é legal, isso não a torna amorosa ou justa. Além disso, uma vez mais, nunca devemos fazer algo que não esteja de acordo com a Lei Áurea.

________
*Para uma síntese biográfica do reformador João Calvino, acesse aqui.   

Para se aprofundar no tema:
BIÉLER, André. A força oculta dos protestantes. São Paulo: Cultura Cristã. 1999.
__________ O Pensamento Econômico e Social de Calvino. São Paulo: Cultura Cristã. 2 edição, 2012.
COSTA, Herminsten M. P. Raízes da Teologia Contemporânea. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
DOOYEWEERD, Herman. Estado e Soberania: ensaios sobre cristianismo e política. São Paulo: Vida Nova. 2014.
LOPES, A.Nicodemus. Calvino e a responsabilidade social da igreja. São Paulo: PES. s/d.
CALVINO, João. A Verdadeira Vida Cristã, São Paulo: Fonte Editorial. 2008. 

Comentários

Postagens mais visitadas