SALMOS IMPRECATÓRIOS: NATUREZA, CONTEXTO E USO (Parte II)

Cativeiro da Babilônia | Autor Desconhecido.

Atualização (03/02/17 - 10h38): Veja a parte I aqui.

Heber Campos Jr. escreve, em seu livro Triunfo da Fé, sobre a relação

Alguns acham que elas são expressões pecaminosas dos salmistas, outros acham que elas pertencem a uma ética sub-cristã do Antigo Testamento e, assim, não tem aplicação para o Novo Testamento. Porém, o próprio Jesus expressa linguagem imprecatória em relação aos seus inimigos (Mt 23.14, 29-36). Alguns poderiam contrapor dizendo que Jesus teria a prerrogativa divina de proclamar maldição pois Deus está acima da sua lei. Jesus, porém, colocou-se debaixo da lei e mesmo proferindo imprecações ele não pecou. Além disto, os salmos imprecatórios são citados no Novo Testamento realçando, assim, status de palavra verdadeira e relevante para todas as épocas. Portanto, não podemos classificar as expressões imprecatórias do Livro de Salmos como sendo pecaminosas ou irrelevantes para hoje.

Para respondermos ao dilema ético e encontrarmos o valor das imprecações é preciso ponderar alguns elementos desses salmos. A linguagem extremamente explícita – que para alguns estudiosos é hiperbólica – expressa o grau de perturbação emocional sentida pelo salmista. Expressá-las ao Senhor não é uma atitude necessariamente pecaminosa. É verdade que elas poderiam resultar de motivações pecaminosas (veja a preocupação de Davi no Salmo 139.19-24). Porém, elas estão inseridas em orações, petições. Elas não são relatos de ações iradas e vingativas.

O pedido desses salmistas não é o de fazerem justiça com as próprias mãos, até mesmo porque a vingança pessoal era condenada desde o Pentateuco (Lv 19.18), mas de deixar a vingança com o Senhor (Dt 32.35; Pv 25.21-22; Rm 12.9, 20-21). A indignação deles é lícita pois resulta de opressões injustas. Mais do que isso, ela provém não só de um interesse próprio, mas de um zelo pela honra de Deus. Afinal, é o povo de Deus que estava sendo oprimido, e o Senhor tem grande ciúme do seu povo (Zc 2.8-9). Por isso as imprecações não são contrárias ao ensinamento de Jesus. Gordon Fee e Douglas Stuart fazem uma distinção entre a prática do amor e sentir amor. É o que você faz por alguém, não o que você sente por alguém que determina o seu amor. Cristo nos exortou a praticar o amor, não sentir amor. É lícito expressarmos nossa ira diante de Deus e ainda continuar a praticar amor para com os nossos inimigos.

Uma das melhores evidências de que os salmos imprecatórios não são expressão de um coração amargurado e pecaminoso é que até os santos no céu, onde não pode deixar de haver santidade (Hb 12.15), clamam “até quando? ”. Em Apocalipse 6.9-11 está escrito:
Quando ele abriu o quinto selo, vi, debaixo do altar, as almas daqueles que tinham sido mortos por causa da palavra de Deus e por causa do testemunho que sustentavam. Clamaram em grande voz, dizendo: Até quando, ó Soberano Senhor, santo e verdadeiro, não julgas, nem vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra? Então, a cada um deles foi dada uma vestidura branca, e lhes disseram que repousassem ainda por pouco tempo, até que também se completassem o número dos seus conservos e seus irmãos que iam ser mortos como igualmente eles foram.

Observe que quem ora “Até quando? ” são as almas que já estão santificadas e se encontram na presença do Senhor. Não há nada pecaminoso em sua prece.

Assim sendo, pecaminosidade não resolvida na igreja e no mundo deve estimular o mesmo clamor em nós. Devemos nos entristecer pelas divisões presentes no meio do povo de Deus assim como Habacuque lamentou as contendas e o litígio em Judá (veja 1 Co 1.10-17; 3.1-23; 11.17-22). Devemos lamentar a violência e as injustiças recorrentes em nosso país. E tal lamento deve ser acompanhado de um anseio por correção, por castigo. Na verdade, a ausência do anseio próprio de imprecações é sinal de indiferença para com o pecado e para com a justiça divina. “Até quando? ” não deve ser entendida como desespero, mas como uma oração esperançosa que provém daqueles que confiam que Deus resolverá a situação, como Habacuque esperava. Portanto, a reclamação de Habacuque é justa. Se o zelo pela justiça divina cresce à medida que nos santificamos, então devemos manifestar o anseio de que o Senhor Jesus volte não só para nos levar consigo, mas também para manifestar a sua justiça.


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Fonte: Voltemos ao Evangelho.

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